01.10.2010
Intervenção Dr. Fernando Nobre sobre as Medidas de Austeridade apresentadas pelo Governo
Quero salientar a necessidade de medidas orçamentais que levem à diminuição significativa do nosso défice e do nosso endividamento externo.
Isso aliviará a curto prazo a pressão externa que é exercida sobre Portugal.
Mas importa desde já notar que as medidas anunciadas levam a:
Aumento do desemprego e da pobreza;
Precarização do trabalho ainda mais gravosa do que a que já existe;
Esmagamento da classe média;
Aumento da crise social e da conflitualidade de forma preocupante;
Diminuição do nosso crescimento económico já muito anémico que nos conduz para uma recessão sem prazo definido.
É importante aprovar o Orçamento, mas não um Orçamento qualquer.
No anúncio destas medidas não se encontra uma única palavra sobre o desemprego, nem uma ideia para o crescimento económico.
Mais grave, não se encontra uma única palavra de esperança ou de mobilização dos cidadãos em torno de um grande desígnio nacional.
Não mobiliza para a resolução dos grandes problemas, não aponta caminhos.
É uma proposta de Orçamento, forjada na desorientação e no medo.
Qualquer plano de austeridade tem de obedecer a uma estratégia económica, porque o grande problema do país é o crescimento económico.
O nosso défice é estrutural. Gastamos mais do que aquilo que produzimos. Gastamos o que não temos. Utilizámos mal os apoios e subsídios que nos chegaram da Europa. Os nossos políticos sabiam dos riscos e agiram como se nada fosse.
Chegámos aqui. Nunca houve tantos desempregados, nunca a dívida pública foi tão elevada e jamais o nosso endividamento externo atingiu estes níveis.
Seria bom então que este fosse o tempo para repensar Portugal. Neste esforço muito deve ser posto em causa – a começar pelo modo como os políticos e os partidos políticos continuam a viver mais das pequenas intrigas e menos daquilo que é essencial para o país.
Afirmam que a comunidade internacional está com os olhos postos na capacidade dos nossos governantes. É bom que estes também não esqueçam os 10 milhões de portugueses que os observam e julgam.
Este é o Orçamento dos três menos: menos emprego, menos salário, menos apoios sociais.
São pedidos mais sacrifícios sem fim anunciado aos trabalhadores, aos reformados e à classe média.
A redução de salários atingirá mais de 500 mil pessoas.
Estas medidas não vão resolver nenhum problema e vão diminuir o consumo.
Estas medidas não criam um posto de trabalho, pelo contrário.
Estamos em crise há mais de uma década. Há mais de uma década que a economia está doente e estagnada. A crise internacional só veio expor o óbvio.
Em 2002 e em 2005 já estivemos nesta situação.
O que correu mal?
Onde está a prometida reorganização da administração publica?
Que aconteceu com a prometida reestruturação do estado?
Onde está o prometido combate á corrupção, ao desperdício e à fuga fiscal?
Onde estão os milhares de empregos prometidos em delírio eleitoral?
O sistema não funciona, são sempre as mesmas políticas com os mesmos actores, com a sistemática degradação de vida dos portugueses num país eternamente adiado gerido por políticos incompetentes.
Cavaco Silva e Manuel Alegre foram durante décadas representantes activos das políticas de desastre económico a que hoje chegámos.
É por isso que me candidatei a Presidente da República. Porque é preciso dizer aos portugueses, olhos nos olhos, que Cavaco Silva e Manuel Alegre são parte do problema e não da solução.
Cavaco Silva foi primeiro-ministro durante dez anos e Presidente da República nos últimos cinco. O seu ministro Miguel Cadilhe já afirmou que o monstro do défice nacional nasceu com ele.
Manuel Alegre foi deputado durante mais de trinta anos. Foi aliás o deputado com mais anos de parlamento. Votou sempre favoravelmente os Orçamentos do Estado e não há registo de uma lei que tivesse sido aprovada no Parlamento proposta por si. Uma proposta para minorar o sofrimento das pessoas ou para resolver alguma questão concreta.
Manuel Alegre é um homem do sistema. É um homem que está na política e vive da política desde 1974. Assistiu na primeira fila à evolução da situação do país e nunca deixou de aceitar pertencer às listas de deputados que, legislatura atrás de legislatura, compuseram o grupo parlamentar do PS.
Eles também são responsáveis pela situação. Vivem do sistema e o sistema defende-os.
É chocante ouvi-los falar sobre as soluções que têm para resolver os problemas. É chocante e uma verdadeira vergonha.
O futuro não se faz com eles.
Eu acredito no meu país, mas não acredito nas pessoas que me dizem mentiras há tantos anos.
Que me dizem que a situação é uma e depois é outra, que me fazem promessas que depois são impossíveis de cumprir, que nos disseram que podíamos consumir e pagar prestações das nossas casas e agora nos dizem que devemos ser patriotas e entregar tudo aquilo que construímos com o nosso esforço.
Eles fazem parte do problema e não da solução.
Temos de repensar o país. Travar de uma vez por todas as grandes obras públicas, reestruturar o Aparelho de Estado, ponderar o fim de muitos institutos, direcções-gerais e fundações. Questionar o investimento que continuamos a fazer com a Defesa, reequacionar o número de Câmaras Municipais, as parcerias público-privadas e a política fiscal em relação aos Bancos que continuam a apresentar impensáveis lucros.
Estou contra o congelamento do salário mínimo, o congelamento das pensões, o fim ou a diminuição do abono de família, a redução de salários e a diminuição dos subsídios e apoios sociais.
Um Orçamento responsável é o que não abandona portugueses.
Um Orçamento patriótico é o que mobiliza todos os portugueses no desígnio nacional de fazer crescer a economia criando melhores condições de vida para todos.
Este também não é um bom Orçamento para os empreendedores e empresários, fundamentais para o crescimento económico, aumento das exportações e a criação de emprego.
Todos os cidadãos devem sentir que fazem parte do esforço conjunto de fazer crescer a economia e não parte do exército dos excluídos.
Não existe Orçamento do Estado viável sem tecido empresarial confiante e bem sucedido e isto só é possível com trabalhadores motivados e empenhados.
O que Portugal necessita é de mais justiça social e justiça económica.
Enquanto cidadão e candidato a Presidente da Republica peço ao Governo que reconsidere as medidas mas gravosas da proposta do Orçamento do Estado que atingem as famílias portuguesas e em particular os mais desprotegidos, as crianças, os reformados e os desempregados.
Peço que reconsiderem em nome da solidariedade e do mais básico sentimento humanitário as medidas que atingirão sem clemência os já 40% de portugueses que vivem na pobreza ou no limiar da pobreza.
Peço em nome da decência, que recordem que por detrás de cada décima estão seres humanos, por detrás de cada percentagem estão vidas e sonhos.
Espero que os partidos representados na Assembleia da República trabalhem para encontrar um bom Orçamento que considere não só a conjuntura internacional mas também a realidade nacional.
Um bom orçamento é o que não hipoteca o futuro.
Portugal ou muda ou afunda-se. Não chega os slogans caros em cartazes de se pretender ser justo e solidário.
É preciso repensarmos Portugal porque se não o fizermos estaremos próximos de uma catástrofe social e a democracia e a nossa soberania estarão em perigo.
Como candidato a Presidente da República e cidadão independente, sem olhar a tacticismo ou cálculos eleitorais, saberei fazer ouvir a minha voz na defesa dos direitos dos cidadãos.
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